sábado, 1 de agosto de 2015

Controlo marxista da Internet

Nunca o marxismo suportou ou suportará a liberdade na Internet. Nunca o marxismo deixou de se infiltrar mesmo em organizações mais aparentemente liberais para tentar controlar a Internet.

Em Portugal, por exemplo, é conhecida a actividade terrorista do PCP organizando "ONG"s no Facebook, publicando artigos da mais elevada qualidade em imbecilidade para, sendo contraditados, promover colectivamente (os elementos do gang-ONG) a participação à Facebook por se tratar de apelo ao ódio, etc, etc. O sistema do Facebook é automático e trata de dificultar o acesso aos atrevidos. Evidentemente que há software para manter o registo dos contactos directos de cada membro do Facebook e uma nova inscrição pode ser feita repondo o status-quo anterior.

É conhecida a aberrativa legislação anti-spam de Portugal e a igualmente imbecil legislação "europeia" para "informar o utente sobre a política de cookies". O segundo caso redundou no aparecimento de filtros que removem os avisos, cuja principal utilidade é de cariz absolutamente fascista por pretender apenas tornar omnipresente a "autoridade" de Bruxelas.

Regularmente, aflora a hipótese de se tornar impossível a comunicação cifrada:

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Estupidez e cobardia juntas resultam numa mistura mais do que porca



«O "Spider Pig", dos Simpsons, também não pode aparecer nas publicações»


Transcrevendo o que aqui se pode ler:

«A Oxford University Press, uma das maiores editoras do mundo, começou a avisar os autores de livros escolares para banirem a palavra “porco” ou qualquer referência ao animal, como por exemplo salsichas. O objetivo é não ofender judeus e muçulmanos, já que para ambas as religiões o porco é considerado um animal impuro.

A revelação foi feita pelo jornalista Jim Naughtie na BBC, durante uma discussão sobre a liberdade de expressão, na sequência do ataque ao Charlie Hebdo, em Paris. Casado com a escritora Eleanor Updale, Jim Naughtie contou que a Oxford University Press enviou uma carta aos autores de livros infantis com algumas diretrizes, entre as quais a proibição de usar a palavra “porcos”, ou outras referências que façam alusão ao animal.

“Bem, se uma editora respeitável ligada a uma instituição académica [Universidade de Oxford] está a dizer que temos de escrever um livro sem que possamos mencionar porcos porque algumas pessoas podem ofender-se, é simplesmente ridículo. É uma piada”, disse Jim Naughtie.

O deputado muçulmano do Partido Trabalhista do Reino Unido, Khalid Mahmood, mostrou-se contra a orientação. “Discordo em absoluto. É um perfeito disparate. E quando as pessoas vão longe demais, toda a discussão cai em descrédito”, disse ao Daily Mail. O líder do Conselho de Liderança Judaica também reagiu: “As leis judaicas proíbem comer porco, não a menção da palavra, ou o animal do qual deriva”, disse um porta-voz.

A Oxford University Press reagiu através de um curto comunicado. “Os nossos materiais são vendidos em quase 200 países e, como tal, sem comprometer de forma alguma o nosso compromisso, encorajamos alguns autores de materiais educativos a considerar de forma respeitosa as diferenças culturais e as sensibilidades”. E acrescentam: “As orientações para os nossos materiais educativos diferem entre regiões geográficas e não cobrem as nossas publicações académicas”.

Se a medida se mantiver, as crianças que lerem os livros da editora britânica vão ficar sem saber quem é a “Miss Piggy” ou “Os Três Porquinhos”, nem vão saber o que são salsichas ou costeletas.»

O que, digo eu, remete afinal para o que aqui já foi dito.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

E diz ela assim:





O problema não são os outros. Somos nós.

Por Helena Matos (no Observador)

Como é que a Europa deve responder aos ataques terroristas? A solução passa sobretudo por medidas securitárias, ou deve passar também pelo combate ao desemprego e pela integração das comunidades árabes e islâmicas? São preocupantes os sinais que apontam para o crescimento da xenofobia?” – No site da TSF estas perguntas lançavam o Forum da passada sexta-feira.

O primeiro impulso seria rir perante o óbvio destrambelho destas perguntas: combate ao desemprego? Mas desemprego de quem? Onde é que na Europa alguma vez o terrorismo foi praticado por pobres ou por desempregados? Os terroristas europeus contaram nas suas fileiras com aristocratas, militares, jornalistas, padres, artistas, estudantes, intelectuais, médicos… Agora que se mata em nome de Alá e não de Marx as profissões são menos diferenciadas. Não temos em 2015 registo de nenhum terrorista que seja editor e aristocrata como foi nos anos 70 do século passado Giangiacomo Feltrinelli nascido em palácio, responsável pelas melhores edições de Itália e bombista que se dizia serviço do proletariado, mas daí a ver-se nos autores dos recentes atentados em França uns jovens que o desemprego e a falta de oportunidades levam a matar os seus semelhantes vai um pedaço de mau folhetim neo-realista que nenhuma realidade sustenta.

E o que se entenderá por “integração das comunidades árabes e islâmicas”? Aliás será que ser árabe ou islâmico faz de cada um automaticamente membro dessas ditas comunidades? Os portugueses que emigraram para França há tantos anos quanto os pais de muitos destes membros das actuais “comunidades árabes e islâmicas” e que ao contrário de muitos deles nem sequer sabiam ler nem escrever e muito menos falar francês que medidas tiveram para promover a sua integração na sociedade francesa?

As perguntas lançadas no Fórum da TSF são semelhantes a tantas outras formuladas nos últimos dias. São perguntas, frases e comentários que partem sempre do mesmo princípio: o problema da violência dos outros somos nós. Porque nós vemo-nos como responsáveis por tudo o que aconteceu e acontece no mundo: para tudo aquilo que os outros fazem há sempre um gesto ou uma decisão que nós ou os nossos antepassados tomámos agora ou há quinhentos anos e que explicam, justificam e de certa forma têm desculpado aos nossos olhos o terrorismo e os terroristas.

Nós, europeus, temos um problema sério. Não com os terroristas que por mais chocante que seja escrevê-lo nestes dias não é a nós, ocidentais, que causam maior dor: enquanto na Europa se repetia “Todos somos Charlie”, na Nigéria o Boko Haram matava 2000 pessoas, na sua maioria mulheres, crianças e velhos sem que alguém se indignasse ou sequer admirasse. Não há semana em que na Nigéria, no Paquistão ou no Quénia o terrorismo islâmico não faça atentados. Meninas de dez anos são transformadas em bombistas suicidas. Das vítimas ninguém sabe nada, nem a idade, nem o nome nem o que faziam.

Ao contrário do que sucede nesses países, o terrorismo islâmico não põe em causa o nosso modo de vida. Muito menos os seus autores têm actualmente capacidade para condicionar a nossa vida política como o fizeram no passado. Pense-se apenas que em 1978 as Brigadas Vermelhas tiveram capacidade para manter Aldo Moro sequestrado durante 55 dias! O que presentemente o terrorismo consegue é confrontar-nos com um mundo que não é apenas os resultados dos nossos actos. E para esse ruir das nossas ilusões não estamos preparados.

O nosso problema com o terrorismo não são os terroristas mas sim o relativismo com que analisamos os seus actos. E quanto mais esses actos nos parecem plausíveis de ser explicados pela cartilha do sociolês mediático (uma espécie de marxismo caldeado com fartura e culpa cristã por viver bem) mais os toleramos. Daí que a condenação que fazemos do terrorismo seja quase indexada ao posicionamento político das vítimas: durante anos e anos a ETA foi tolerada porque as suas vítimas eram geralmente militares, agentes da Guarda Civil, militantes do PP, empresários… enfim gente que nesse discurso justificativo se procurava sempre associar ao franquismo. Quando se tornou óbvio que as balas da ETA não distinguiam as nucas da gente de esquerda das da gente de direita era como se se estivesse perante um desacerto desses rapazes um pouco excitados mas apesar de tudo gente de causas. E só nessa fase em que ser de esquerda deixou de ser um escudo perante a ETA muito boa imprensa tida como de referência deixou de tratar a ETA como movimento independentista para passar a designá-la como aquilo que sempre foi: terrorista.

Pelo contrário não houve qualquer simpatia, enquadramento socio-cultural ou tentativa de compreensão das razões que levaram Anders Behring Breivik a matar vários dos seus concidadãos na ilha de Utøya. Breivik era branco e de olhos azuis, não podia ser integrado em comunidade alguma e era de extrema-direita. Logo foi visto como aquilo que era: um terrorista e não o resultado de uma qualquer exclusão. Aliás se os irmãos Kouachi tivessem levado a sua mortandade a cabo não no “Charlie Hebdo” mas sim num jornal de direita não faltariam neste momento explicações para os seus gestos.

Por exemplo explicações similares às que foram dadas em 2005 aquando do assassinato por um fundamentalista islâmico do cineasta Theo Van Gogh, ele mesmo, a vítima, definida como um “provocador”. Ou aquando dos atentados do 11 de Setembro em que a culpa era inevitavelmente de Bush, dos americanos que “estavam a pedi-las” e das torres que eram um símbolo do poderio capitalista. Explicações similares às dadas quando o jornal dinamarquês “Jyllands-Posten” publicou várias caricaturas de Maomé: condenou-se rapidamente a violência para logo em seguida se partir para o perfil “populista” da publicação e, em seguida, desenvolver longos raciocínios sobre a problemática da intolerância. Não, como em abstracto se esperaria, da intolerância dos agressores mas sim daquela que em nome das vítimas poderia vir a ser desenvolvida…

Os exemplos não faltam. Nem vão continuar a faltar. Embora se possa ser levado a pensar que o agora sucedido em França virá a marcar um antes e um depois na forma de olhar estas questões na Europa. A própria forma como a sociedade francesa está a reagir dá conta de algo que vem de muito antes e que não se restringe ao fundamentalismo islâmico: estamos perante um país que perdeu para a Inglaterra o lugar de quinta economia mundial e em que o ministro da Economia, Macron, teve de se explicar porque declarou que era positivo que os jovens franceses desejassem ser milionários. Um país onde grupos de jovens assaltantes conseguem bloquear comboios, assaltar os seus passageiros (às vezes seleccionando nestes e noutros ataques as vítimas pela sua aparência racial) e ainda atacar as equipas de socorro.

Um país que precisamente dias antes destes atentados viu com estupefacção serem publicadas fotografias tiradas dentro de prisões francesas: a avaliar por aquilo que ali se via de consumos de drogas e ostentação de dinheiro algumas prisões francesas são um espaço cujo ambiente parece retirado de um qualquer festivo e sórdido casino. Se se recuar uns meses e se se trocarem estas fotos pelos parágrafos de um relatório policial constatar-se-á que, segundo os autores desse estudo, as prisões francesas são um dos principais locais de radicalização dos jovens muçulmanos pois não existe qualquer capacidade de controlar a actividade dos imans nos estabelecimentos prisionais. Como não podia deixar de ser rapidamente se esqueceram os avisos contidos nesse relatório para mediática e politicamente o tomar como pretexto para um tema bem mais aliciante e politicamente correcto: correm as prisões francesas o risco de se transformar num novo Guantanamo?

A França é o país onde todas as semanas aparece o problema de uma funcionária de supermercado ou escola que pretende trabalhar de rosto completamente tapado mas onde paralelamente as activíssimas associações ditas de livre pensamento, que se calam respeitosamente perante a actividade dos fundamentalistas islâmicos, exigem com urgência que se proíbam os presépios nos espaços públicos. O país onde as autoridades se regozijaram porque na noite da passagem de ano foram incendiados apenas 940 automóveis: afinal em 2014 tinham sido contabilizadas 1 067 viaturas queimadas. (Já agora quantas notícias se leram sobre estes factos na imprensa portuguesa? Será que os jornalistas não sabem francês ou simplesmente não estão preparados para dar notícias que não cabem na sua quadratura do mundo?)

Um país onde abordar boa parte das questões que vão do mundo do trabalho, à habitação e às escolas se torna num campo minado em que em vez de se discutirem os problemas concretos logo se define que colocar determinada questão é discriminatório, passando com fervor a discutir-se se A ou B é xenófobo. Patrões, professores e funcionários estão entregues a si mesmos perante uma minoria que escudada nos conceitos de comunidade exige de facto um tratamento diferenciado para impor a sua vontade aos demais e retirar as maiores vantagens do sistema (não estou a falar apenas dos radicais muçulmanos mas também deles).

Mesmo umas prosaicas salsichas numa festa de escola infantil podem tornar-se em França no pretexto para que algumas famílias, alegando que não comem carne de porco, não só tenham direito, como é desejável, a uma comida diferente, mas acabem a impor as suas regras a todos demais. Pois face à recusa destas famílias de partilharem um grelhador onde tivessem estado carnes que consideram impuras, a alguns professores não ocorreu melhor ideia que acabar a só servir salsichas halal. Ou seja salsichas confeccionadas com animais abatidos segundo os ritos da religião muçulmana. Naturalmente esta decisão foi tomada e justificada em nome da tolerância

Com aquela espécie de complexo napoleónico de quem já teve um imperador e agora tem presidentes em declínio, a França adoptou perante os seus problemas a mesma atitude que tem perante a crescente influência do mundo anglo-saxónico: fala de excepções culturais, usa a retórica da “grandeur” e apresenta contabilidades engenhosas para iludir a realidade. O resultado é catastrófico. Na rua a realidade impõe-se. E na política, o país que prefere as revoluções às reformas e que acha que o mundo em geral e a França em particular se ordenam por declarações de vontade prepara-se para mais uma vez tentar suster a evolução da economia e da História. Agora premiando eleitoralmente os radicais de direita. De quem esperam exactamente o mesmo que esperaram quando a esquerda elegeu Hollande: que façam leis que garantam à França um estatuto excepcional no mundo e que portas adentro os consigam tirar desse inferno de intolerância a que em nome da tolerância chegaram.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

"Morrer de pé em Paris"




Por Rui Ramos (no Observador)

Charb, Cabu, Tignous, Wolinski e os seus colegas da Charlie Hebdo nunca aceitaram limites. Eram “anarcas” de antes do politicamente correcto, que nem ao bom gosto faziam concessões. Podiam-se ter ficado pelos presidentes franceses, pela extrema-direita local ou pelo papa – alvos relativamente pachorrentos. Mas não. Tiveram de gozar o Islão e os seus jihadistas, porque, como explicou Charb, para ele, Deus não existia e Maomé não era, obviamente, o seu profeta. Acabaram, por isso, a desenhar sob protecção policial – uma suprema ironia: Maio de 68 defendido pelos gendarmes. No fim, nada lhes valeu.

O atentado, como alguns disseram, era previsível. E a nossa reacção também. Fomos Charlie, como em tempos fomos americanos. Desfraldámos, mais uma vez, os grandes estandartes da “liberdade” e da “união”. Nesta aparente unanimidade, houve algo de reconfortante, mas talvez também algo de enganador: a sensação de que, no fundo, a vitória é certa, porque a razão, a história e outras grandes abstracções lutam por nós. Os terroristas estariam de antemão derrotados e a barbárie, por mais sangrenta, seria sempre algo de fútil.

A ideia de que o mal, só por ser o mal, está destinado a perder é uma crença religiosa que o progressismo secularizou e perfilhou. No entanto, nem sempre ajuda a compreender as coisas, especialmente na sua versão laica, muito mais automática e simplória: o facto é que o terror faz sentido e é eficaz. Lembremo-nos do 11 de Setembro. Para começar, destruiu o à-vontade com que tínhamos passado a viver no Ocidente depois do fim da Guerra Fria. Depois, empurrou os EUA para intervenções na Ásia, dividiu as potências ocidentais, e sobretudo isolou a população islâmica no Ocidente.

Alguém se lembra de “islamofobia” antes de 2001? Era quase preciso recuar à Idade Média. Na década de 1990, só Samuel Huntington via na civilização islâmica um desafio. Todos os seus colegas politólogos andavam muito ocupados com a suposta ameaça dos “nacionalismos”. Depois de 2001, a história passou a ser outra. Foi então que os movimentos anti-imigração na Europa se expandiram decisivamente, depois de uma xenofobia já mais ou menos desacreditada ter sido reforçada pela desconfiança em relação ao Islão fomentada pelo jihadismo. As novas “manifestações de segunda-feira” na Alemanha ainda por enquanto encontram contraditores. Mas se as carnificinas jihadistas alastrarem, quantos mais europeus vão sentir que só as fronteiras fechadas e o nativismo de Marine Le Pen os poderão defender?

O alvo do terror jihadista no Ocidente são, na verdade, as comunidades muçulmanas e a possibilidade de estas viverem a sua fé de outra maneira que não em estado de furor inquisitorial. O polícia assassinado na rua a seguir ao ataque à revista chamava-se Ahmed Merabet. Na redacção, morreu um revisor de provas com o nome de Mustapha Ourrad. Eram muçulmanos, como aliás todos aqueles que os jihadistas matam regularmente às dezenas e às centenas no Médio Oriente, no Afeganistão e no Paquistão. No Ocidente, o objectivo dos jihadista não é zelar pelo Islão, é comprometer os muçulmanos, é impedir a sua integração nas democracias, é estigmatizar o Islão, é reduzi-lo, aos olhos de todos, a uma simples plataforma de terror.

Não estamos perante uma lógica exótica. Conhecemo-la dos terrorismos da extrema-esquerda europeia da década de 1970. A tese era que não havia diferença entre a democracia representativa e a ditadura fascista: ambas eram organizações de classe para oprimir o proletariado. A violência dos guevaras de subúrbio estava calculada para provocar a violência do Estado democrático, de modo a que este revelasse a sua verdadeira natureza de ditadura de classe. O proletariado seria assim levado a optar pelo confronto violento. Os jihadistas, com o seu terror, contam pôr o Estado democrático e a diáspora muçulmana na mesma situação de tensão e conflito.

Tudo isto pode limitar as nossas liberdades, mas convém perceber como. Pode limitá-las se tivermos de começar a desenhar e a escrever protegidos pela polícia. Quantos vão preferir morrer de pé, como Charb morreu em Paris? Mas o terrorismo afectará as nossas liberdades sobretudo se os jihadistas conseguirem adquirir um ascendente sobre as populações muçulmanas que seja suficiente para obrigar as autoridades ocidentais a tratá-las globalmente como um risco de segurança. As nossas democracias estariam perante um dilema: como é que um país pode ser verdadeiramente livre se precisar de manter uma percentagem importante da sua população – no caso da França, 7,5% dos seus residentes em 2010 eram muçulmanos — sob suspeita e vigilância? É nisso que os jihadistas apostam, e é uma aposta que não devemos subestimar.


Neste momento, só há uma maneira de conter a “islamofobia”: é derrotar o jihadismo, e para derrotar o jihadismo vai ser preciso mais do que um hashtag de bons sentimentos.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

NATAL ZERO CATORZE



 (Gravura de Nicolau Saião) 



Quem fala de Natal perde palavras
à entrada do Inverno, na secura dos dias
no vasto frio das noites, tão lúcidas e antigas
tão de infância e de Agosto. O fogo
misturado: árvores, luzes, fantasmas
e as doces mãos das Avós. E ainda
um postal velho velho cheio de vento e de memórias.

Quem fala de Natal perde palavras, ganha
e perde as demais coisas que as palavras edificam.

“Quem grita no Natal? E Deus
não os fulmina? “. Quem mergulha os seus pulsos
na fria água do rio?  Com seus chapéus à banda
em barcos engalanados
os anjos vão passando, dizendo amores esquecidos
dizendo estranhas frases, assombrando as moradas
onde afinal não nasce o tal de Nazareth. O sal e o
pão terrenal dos que ainda não foram
pelo ar, pela vida, pelos túmulos vazios.

Sim, pelo Natal as pobres casas em ruínas.

Para ser do Natal é preciso possuir
uma lembrança ardente, um brinquedo estripado
e muita tristeza feita nos anos em leilão
dos retratos tombando com um nó na garganta.
Para ser do Natal é preciso morrer
e viver de seguida com o sangue nos braços
esperando a estrela fixa do brusco espanto nocturno
junto à porta perdida dum milagre adiado.

Ah falar de Natal! Quem o consente?

O pão e o sal
talvez
de toda a gente. E um olho de animal
pairando no poente. Decisivo, visceral. E Deus, pobre dele
abrindo a água lustral (no bem, no mal)
frente ao horror da morte
terrena e inocente.

Por isso, no Natal
os segredos demoram
e tudo muda e tudo se envolve num pano branco barato
para que ninguém esqueça um corpo ferido que por debaixo jaz
uma nova e desconhecida espécie de cadáver achado na ilha
dos animais inominados
e outras diversas coisas que por desespero se não apontam.

No Natal treme a casa, a casa
sempre caiada, como um sepulcro sem número e sem nome.

E o inventário dá, se estiver certo:
um coração ardido todo azul
uma recordação minúscula que se guardou num bolso
um riso salutar ensanguentado
uma pequena ironia desenhada a tinta de colegial
uma apenas esboçada mão posta sobre um antebraço
o lenço de cabeça duma tia que desapareceu na manhã
um gato tranquilamente dormindo ao cimo das escadas
uma rosa e uma palavra que a si mesmas se julgaram
duas mãos de pedra tremendo atravessadas por uma ferida
numa cruz de polo a polo
um hálito que soprado no peito nos enlouquece
um arrepio, uma agonia
uma tarde a fechar-se repleta de amargura e de alegria.

Talvez o Natal seja um rosto
ou uma madrugada de outono
ou um avião nocturno
ou um verão por detrás das coisas aparentes
ou um combatente jazendo de borco numa pia baptismal
ou os bramidos de dois seres abandonados encarando-se de súbito
numa rua da cidade
no escuro muito escuro de uma cidade do universo
quer dizer – luminosa e aterrada. E talvez

que tudo afinal esteja a mais, que tudo afinal
se resuma a filhós e azevias de um outrora
a canecas de café familiar
algures num horizonte, numa idade, num momento
no imenso murmúrio de uma voz sulcando o tempo.

E a chuva   que diabo   irá cobrindo tudo
no infinito Natal dos mundos desaparecidos.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Da requisição civil na TAP ou Do particular interesse público




(retirado daqui)

Guterres tentou vender a TAP. Sócrates tentou vender a TAP. E Passos Coelho está a tentar vender a TAP. Diferenças, há uma: desta vez é muito provável que aconteça. E a iminência da privatização assustou muita gente que, passados estes anos, subitamente encontrou nessa intenção um plano neoliberal. Não me vou alongar aqui acerca da privatização, que vejo como necessária para salvaguardar a prestação de um serviço público de qualidade. O que pretendo é discutir a opção do Governo pela requisição civil e este tipo de greves drásticas como “arma” negocial. (…)

(…) alguns alegam que não são interesses particulares que estão em jogo, mas sim a verdadeira defesa do interesse público – neste caso, a resistência à privatização da TAP. Desculpem, mas não é verdade. Primeiro, porque se a questão é a privatização, esse é um dossier político, a ser debatido pelos partidos políticos com o Governo, e não pelos pilotos. Segundo, porque nesta greve sempre estiveram em causa assuntos particulares, e não de interesse público.
Para o confirmar, basta consultar a irrealista lista de exigências dos sindicatos da TAP. E basta ver a razão que levou a que não se conseguisse acordo entre estes e o Governo: os pilotos querem uma fatia maior das acções da companhia, sem contrapartidas financeiras. Agora expliquem-me: de que modo é que a pretensão dos pilotos, que impediu o acordo entre sindicatos e Governo, é parte da defesa do interesse público?
O que me choca realmente é que este tipo de iniciativas sindicais – irrazoáveis e claramente motivadas por interesses particulares – reúna tamanho apoio na opinião pública. Mas aí está a hipocrisia do debate: ninguém quer saber o que motiva os sindicatos, desde que a oposição ao Governo seja feroz e provoque danos políticos. Daí que haja tamanho aproveitamento político destas iniciativas sindicais por parte de partidos políticos cuja representação na Assembleia da República é minoritária. É neste ponto que estamos: o que verdadeiramente interessa a todos é que estas greves são o mais apreciado e eficaz instrumento político para encostar ministros à parede.
Ora, isso parece justificar tudo. Incluindo afirmar, como faz Mariana Mortágua, que esta greve defende os emigrantes portugueses, mesmo que estes ficassem privados de passar o Natal em família (como se a privatização acabasse com as rotas aéreas). Se as razões acima não fossem suficientes, até para combater esta hipocrisia a requisição civil foi uma boa solução.

sábado, 13 de dezembro de 2014

A Instituição José Sócrates





Um dos fundadores do PS, António Campos, em visita ao seu amigo José Sócrates, disse aos jornalistas, à porta do Estabelecimento Prisional de Évora, que "a política é a política e a Justiça é a Justiça" e que, nesse caso, sendo um ex-primeiro ministro quem ali se encontrava detido, é a própria instituição democrática que está em causa.

Ora, segundo aquilo para que tudo aponta, é por ter querido pôr em causa a instituição, aprisionando-a em proveito próprio enquanto primeiro-ministro, que José Sócrates foi preso preventivamente para libertar a instituição da sua eventual acção criminosa enquanto aguarda pela conclusão das investigações.

Acrescento, assim, ao que aqui disse:

Sócrates deveria, até, haver procedido e continuar a proceder de modo contrário ao que fez e faz. Em defesa do Estado de direito, inocente do que o acusam, enquanto ex-primeiro-ministro e democrata convicto vítima de uma cabala tenebrosa, deveria ter-se apresentado voluntariamente para ser preso, convocando a Comunicação Social e exigindo, ao mesmo tempo, uma investigação completa ao seu caso. De modo a proteger-nos desse polvo que começara por querer aprisioná-lo.

E, já agora, pedido contenção pública nas emoções aos amigos.

Acho eu.

Um comentário interessante




Achei que deveria dar relevo ao comentário de um leitor, Heitor Cavaleiro, ao post anterior:

Vejamos: o que Soares fez, no seu desbragado acinte junto à prisão de Évora, foi praticar um acto antidemocrático como os muitos que tem protagonizado. Soares não deseja que o seu pupilo seja julgado, com todas as garantias de defesa como é de uso num Estado de Direito. O que Soares quer é eximi-lo a julgamento! Ou seja e em bom português, manipulando as massas e tentando intimidar os juizes, "safar o couro" ao antigo governante. Recordemos como Soares foi tão propício para Betino Craxi, Ceausescu, Andreotti, Sadam e outros que tais, tudo em nome da piedade formal...E o mesmo faria se outros notórios tipos, como Lula e Maduro, tivessem de responder pelos seus desmandos. Soares estará sempre do lado dos que abusam do Povo, como ele tantas vezes fez disfarçadamente.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Sobre a culpa da presunção intencional




Diz ainda José António Saraiva, neste outro editorial:



Da presunção de inocência à presunção de culpa

Nestes tempos de completa loucura têm-se dito imensos disparates e passado para a opinião pública muitas ideias erradas. Destaco oito questões, que merecem um comentário.

DETENÇÃO

Afirmou-se que Sócrates foi detido “com grande aparato mediático”.
Não é verdade.
Não existe nenhuma imagem da detenção de Sócrates, nem sequer do seu trajecto através do aeroporto acompanhado por agentes, depois de detido. 
A única coisa que existe é o vídeo de um carro avançando na noite - aparentemente filmado com um telemóvel -, que não se sabe quem leva lá dentro.
Se fosse nos EUA, Sócrates teria sido detido dentro do avião e algemado. 
Porém, os agentes esperaram por ele à saída da manga e conduziram-no por um percurso discreto, em que não houve contacto com jornalistas. 
A detenção não poderia ser mais recatada do que foi.
POLÍTICOS SÃO IGUAIS?

Alguns comentadores disseram que uma das consequências desta prisão seria consolidar a ideia de que “os políticos são todos iguais”.
Todos iguais, como?
Alguma vez na História de Portugal (e não apenas na democracia) um ex-primeiro-ministro foi preso?
Alguma vez houve um caso sequer parecido com este?
Esta prisão pode ter o efeito exactamente contrário: começar a separar o trigo do joio, a boa moeda da má moeda, para não serem todos metidos no mesmo saco.
Uma justiça independente e eficaz contribuirá para estabelecer diferenças entre os políticos - e não, como se pretendeu fazer crer, para os tornar 'todos iguais'. 
CARTA DE SÓCRATES

Noticiou-se que, no 'comunicado' enviado à TSF e ao Público, Sócrates  “desmentia as acusações de que era alvo”.
Ora, o texto não desmentia nada, nem podia desmentir, pois aí Sócrates teria de reproduzir as suspeitas que existem contra ele e depois rebatê-las. 
Mas isso seria uma violação grosseira do segredo de Justiça. 
O comunicado de Sócrates limitou-se a seguir a sua velha receita: sempre que é acusado, apresenta-se como vítima de uma cabala. 
Quando saíam notícias que o comprometiam, Sócrates fazia-se de vítima, virava os acontecimentos a seu favor e partia para o contra-ataque. 
Foi assim no caso do diploma, no Freeport, no Face Oculta, no Taguspark, etc. - e é assim agora.
Esta carta foi o remake de um filme velho, numa linguagem gasta: “infâmia”, “abuso”, “falsidade”, “prepotência”, “imputações absurdas”, “humilhação gratuita”, etc. 
Mas, em certo sentido, a carta de Sócrates era uma carta desesperada. 
O grito de alguém que sabe que dificilmente fugirá a ser condenado e se apresenta ao povo como um D. Quixote que desafia sozinho a Justiça (“o processo é comigo e só comigo”).
MÁRIO SOARES

Disse-se que Mário Soares foi a Évora prestar “solidariedade ao amigo José Sócrates”.
Ora, não foi bem isso. 
Sem se aperceber, Soares viajou no tempo até à época da ditadura, em que, na qualidade de advogado, defendia presos políticos e ia visitá-los à prisão. 
Na cadeia de Évora, Soares não tinha Sócrates na sua frente: tinha um oposicionista do passado, preso pela PIDE por razões políticas.
Foi por isso que Soares disse, por exemplo, que Sócrates estava preso “sem ter sido julgado” (frase que só faz sentido no contexto de um regime ditatorial).
BAGÃO

Bagão Félix achou que o caso dos Vistos Gold é “mais importante do que as suspeitas de corrupção de Sócrates”. 
Francamente, dr. Bagão!
Então a detenção de funcionários públicos por facilidades na obtenção de vistos de residência, por mais altos que sejam os seus cargos, é mais importante do que a prisão de um ex-primeiro-ministro por suspeitas de corrupção, em proveito próprio, no exercício de funções? 
O alegado suborno de um chefe de Governo para adjudicar obras de construção civil em muitos casos desnecessárias - obras essas que também contribuíram para levar o país à bancarrota - é menos importante do que uns vistos, por mais dourados que sejam? 
Na sua ânsia de atacar o Governo, Bagão perde a noção da realidade.
VISTOS GOLD

Foi  chocante o modo diferenciado como muitas pessoas reagiram perante dois casos separados apenas por oito dias. 
No caso dos Vistos Gold, elogiou-se o trabalho da investigação, ninguém criticou as fugas de informação nem invocou o segredo de Justiça, deram-se logo os suspeitos como culpados, falou-se de corrupção ao mais alto nível do Estado, considerou-se “inevitável” a demissão de Miguel Macedo e todos concordaram que o escândalo afectava o Executivo de Passos Coelho, ao ponto de António Costa considerar que a partir daí o Governo ficava “ligado à máquina”.
No caso Sócrates, criticou-se asperamente a magistratura, invocou-se o segredo de Justiça e atacaram-se os jornais que o desrespeitaram, considerou-se a detenção “desnecessária e humilhante”, repetiu-se até à exaustão que os suspeitos são “presumivelmente inocentes”, não se exigiu a demissão de ninguém, garantiu-se que o escândalo não afecta muito o PS e que António Costa deve prosseguir o seu caminho como se nada fosse.
Há pessoas que não têm uma réstia de pudor.
CORRUPÇÃO

A defesa de Sócrates afirma que no inquérito “não existem quaisquer indícios de corrupção”.
Será que anda a dormir?
Durante o consulado de Sócrates, o Grupo Lena passou de pequena empresa regional a grande potentado da construção civil, com fabulosos contratos no estrangeiro (designadamente na Venezuela). Até aqui, não se pode dizer nada.
O Grupo Lena foi, nesse mesmo período, contratado pelo Estado sem concurso público em obras de centenas de milhões de euros. Mas isto também não prova nada.
Carlos Santos Silva, o amigo de Sócrates, foi - igualmente no período de que estamos a falar - administrador do Grupo Lena e, a seguir, de uma empresa criada por este (a Lena Management & Investments SA, depois chamada XMI). Até aqui, ainda não se pode garantir nada.
Carlos Santos Silva passou para a conta de Sócrates (ou deu-lhe em dinheiro vivo) muitas centenas de milhares de euros ou mesmo milhões, comprou-lhe casas por um preço muito superior ao seu valor, e cedeu-lhe um luxuoso apartamento em Paris para viver (ou o apartamento pertencia mesmo a Sócrates e estava no nome do amigo?). 
Ora, aqui já a porca torce o rabo. 
Santos Silva deu tanto dinheiro a Sócrates porquê? 
Por ser amigo dele e querer ajudá-lo num momento difícil da sua vida, quando vivia exilado em Paris sem meios de subsistência, com o risco de passar fome e ter de dormir ao relento, como os clochards, em cima das grelhas do Metro? 
Não brinquemos! 
A partir daqui, não pode dizer-se que não existem indícios…
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA?

Toda a gente, sem excepção, diz que Sócrates goza da “presunção de inocência”.
E diz bem. 
A presunção de inocência é uma figura jurídica (importantíssima) que existe para que um indivíduo não perca os seus direitos antes de ser condenado. 
Mas, em linguagem corrente, a situação de Sócrates já não é exactamente essa. 
E isto porque o juiz, depois de ver os resultados da investigação, considerou provável que Sócrates tenha praticado mesmo os crimes de que é suspeito, mantendo-o em prisão preventiva.
Não quer dizer, evidentemente, que Sócrates venha a ser condenado.
Pode vir a ser inocentado.
Mas, neste momento, a presunção que sobre ele existe já não é de inocência mas de culpa.