terça-feira, 17 de julho de 2012

MOMENTO DE POESIA, novo fado português



 Nicolau Saião, O caçador (desenho a tinta-da-china)

   Dias atrás um confrade meu, grande poeta brasileiro (um dos maiores que aquele país irmão possui) enviou-me uma das suas habituais missivas – que sempre recebo com gosto – e a certa altura lamentava impressamente que eu perdesse tempo a escrever coisas políticas (sic), pois o que ele achava digno era eu dar-vos poemas, poesia própria e alheia (e eu agradeço o mimo de considerar que faz sentido eu dar aqui a lume o material de fabrico próprio a par do de fabrico alheio…).

  É capaz, mas não o iria asseverar, de ser verdade. De ter ele razão. No entanto, ao mesmo tempo que o lia, sentia bater-me nas orelhas a frase lúcida de António Maria Lisboa, que rezava e ainda reza “A crítica é a razão da nossa permanência”, a par daqueloutra de Manuel de Castro “Chama-se UM HOMEM àquele que sabe o que está fazendo” e, “the last but not de least” como usa dizer o famoso crítico lusitano cujo nome não me ocorre de momento, ainda a de Camus, que arruma, creio eu, a questão definitivamente: “A poesia e a prosa nunca devem esquecer que se são feitas por um impulso que não tem por norma o testemunho ético não passam de actos desumanos ou, no limite, de egoísmos ou mesmo de canalhices”. (E não devemos esquecer que há a crise que nos sufoca, provocada por estimáveis homens públicos ladrões e/ou caloteiros – e agora nós é que temos de esportular as lecas para encher o buraco que esses amáveis bandidos escavaram…Porque havemos de passar em branco as suas malfeitorias?).

   Mas como sou, creio eu, um tipo tolerante e – talvez por ser fraquito e um pouco medroso – um esforçado gerador de consensos, pensei que podia conciliar as coisas e dar poesia que, simultaneamente, tivesse algum pequenino gesto social.

  Vai daí saíu-me o que aqui vos deixo, com o xi-coração de sempre pelo menos para as minhas estimadas leitoras:


FADO PORTUGUÊS

Vamos lá falar a sério:
a nação está estragada.
Só há uma solução:
- malta, vamos p'rá porrada!

Até sou um tipo afável
mas isto assim não dá nada...
Temos justificação:
- malta, vamos p'rá porrada!

Tudo limpinho e às claras.
Em segredo não vale nada
e os da “secreta” vigiam…
- malta, vamos p'rá porrada!

O Sócrates lá na estranja
leva vida regalada
e nós aqui a tinir…
- malta, vamos p'rá porrada!

O Constâncio melhorou
recebe uma batelada!
Aqui, perdeu quem poupou
- malta, vamos p’rá porrada!

Até o Cavaco ganhou,
tem vidinha prestigiada
pois engrola o que sempre engrolou…
- malta, vamos p'rá porrada!

Diz ao povo para ter calma.
É uma treta pegada,
ele quer é safar os gandulos…
- malta, vamos p’rá porrada!

Confiava no sô Lima…
e o Loureiro figura amada
merecia-lhe toda a estima…
- malta, vamos p’rá porrada!

O Arménio propagandeia
e é só conversa fiada.
Quanto ao Xico, é um varre-feiras…
- malta, vamos p’rá porrada!

O Seguro é um alfenim
de cantiga bem cantada,
mas andou co’ Sócrates ao colo!
Malta, vamos p’rá porrada.

Mandantes? Urina neles
pois é tudo uma cambada.
Só há uma coisa a fazer
- malta, vamos p'rá porrada!

Vamos agir em conjunto,
está a pátria ameaçada.
Sem temor, tratemos deles...
- malta, vamos p'rá porrada!

O caminho é só já esse:
ou nós ou a Força Armada.
Temos de salvar o país!
- malta, vamos p'rá porrada!

Viram como foi lá fora?
É uma coisa danada,
estes gajos só percebem
se a malta for p'rá porrada!

Por isso, nada de medos.
E de cara levantada
sem coisas clandestinas:
- MALTA, VAMOS P'RÁ PORRADA!!!

Sem comentários: